O caricaturista brasileiro
Ricardo Soares, de tanto dizer que odeia computador, ganhou uma crônica: "Odeio
computador!". Depois da crônica, leia entrevista exclusiva com Ricardo, que fala de sua carreira e do mercado de ilustração no
Brasil.
A CRÔNICA
Odeio computador!
Cris Campos
- Cara, eu odeio
computador. Odeio!Como alguém de
olhos fechados que abre os sentidos bem devagar, ouvi aquela frase crua.
Desacelerei, para captar melhor a explosão. Categórico, Ricardo afirmou isso
diante do seu inimigo.A máquina
pareceu sentir o ódio. Magoada, recusava-se a lhe oferecer de boa vontade as
soluções para colorir um desenho enviado por uma amiga. Desenho entregue por
e-mail. Nem com esta ajuda do correio eletrônico, apiedou-se. O usuário olhava
feio para a estação de trabalho que deixa morar na sua casa.Meia hora de
briga. Até o mouse estava cansado. E nada. Enquanto isso, pude anotar o
suficiente na cabeça para esta introdução.De perto,
Ricardo sentado na grande mesa sobre estacas, diante do micro grafite. CPU com
cara de frente de carro, teclado moderno, ergonônimo. Preto e prateado
combinavam bem no aparelho maldito, que sugava os olhos do humano à sua frente,
de cabelo preto-e-branco por coincidência, ou convivência.Ele repetiu:-
Odeio computador. Agora, deu de travar. Olha
isso!Aquela frase de
ira parecia meio fora de foco a princípio, por isso agucei os seis sentidos.Rodopiei os
olhos pelo local e pude ver melhor. Ricardo na mesa grande do micro, ao lado do
fax, diante do quadro de cortiça, à esquerda do calendário de mesa.Realmente, quem
estava deslocado ali era o coitado do computador. Tudo o mais à sua volta
dialoga com a arte do desenho e da pintura feita à mão. Mais precisamente para
a arte da caricatura, que hoje exige mais do tempo de Ricardo.Até na hora do
jantar, os desenhos paralisam tudo, comandam o cenário.O computador
fica inibido, rodeado por potes e copos cheios de lápis, canetas,
"coisas" de desenhar, para desenhar, sobre desenhar. Pudera, é
máquina parida em escala no meio de um apartamento de artista. Isolado, sem
defesa, diante da forças das artes plásticas que assombram o 1.207. Liberdade é
o nome do bairro, mas não foi oferecida a ele.Imagine
humilhação que não deve ser ficar imobilizado, pregado sobre aquela mesa com
cara de utensílio de pintor. Tudo piora quando o destaque do cômodo é o
carrinho vermelho para desenho, a poucos centímetros. Projetado na Itália,
acomoda produtos para artes como um berço faz com um bebê. Abarrotado de
gavetas, andares, espaços para esboços, pincéis, lápis, bastões, réguas, papéis
especiais.Aquele artefato
parece uma Ferrari. Tem quatro rodas, design italiano e cor brilhante que te
obriga a fixar os olhos. E fica cheio de coisinhas interessantes, badulaques,
rabiscos, desenhos, obras acabadas. E nunca ouve desaforos, muito menos
palavras explícitas de ódio com ponto de exclamação no final.O pobre
computador, refém deste espaço, parece gritar quando se olha mais de perto:- Socorro!Mais à frente e
perto da grande janela, outra mesa mais imponente se instala. É uma prancheta,
uma "tábua ou mesa própria para desenhar", segundo o dicionário
Aurélio, página 1.614. Esta desfruta das luzes e da alegria daquela vista: São
Paulo de dentro do coração - Catedral da Sé à esquerda, grandes avenidas, muitas
luzes coloridas, helicópteros e aviões animados no céu, carros que vão e vêm,
com suas luzes vermelhas e brancas. De dia, outras cores aparecem, junto com
novos aviões e helicópteros, bailarinos no céu.Aquela janela
colorida é a maior amiga do Ricardo, na sua casa-estúdio. Porque ajuda na
produção dos desenhos sobre a prancheta. Naquela noite, à direita da caixa
vermelha de metal com os famosos lápis suíços Daran d'Ache, para aquarela,
repousava uma caricatura recém-aprovada do ator brasileiro Taumaturgo Ferreira.-
Feita à mão. É disso que eu gosto. E está
aprovadíssima!Disparou Ricardo
da frente do computador. Ele tentava ser solidário ao meu tour, mas seu ódio
pelo computador era maior.A janela
guardava a chuva e o frio do lado de fora. Também protegia mais e mais material
para desenho e pintura aos seus pés. Do lado oposto ao da prancheta, uma mesa
de luz e um cavalete para pintura, em local de destaque. Porque Ricardo tem
muitos quadros a óleo para pintar e, às vezes, uma ou outra caricatura gosta de
descansar ali.Quase ao final
da volta, uma estante aconchega livros, gibis (gíria para histórias em
quadrinhos). Uma escultura em barro terracota da cabeça do Ricardo com barba
debaixo de uma fita do Senhor do Bonfim equilibra aquele monte de papel. Livros
sobre os grandes mestres do desenho à mão livre, caricaturistas do mundo todo,
vários livros do Chico Caruso, o irmão "quase igual" do Paulo, que
também é artista do desenho. E tome quilos e quilos de livros sobre pintores,
bem de frente com o cavalete do pintor que mora naquele andar.Do outro lado da
estante, um guarda-roupas. À frente e já no limite da parede, uma cama de
casal, com edredon.Naquele canto,
mais afastado da poderosa janela, fica a mesa do computador. De dia ou de
noite, ele não sente as luzes de fora, nem os arco-íris, as cores que se
apressam na grande cidade. E nunca saberá desenhar sozinho, nem pintar, nem
resmungar, nem manusear coisas de artista, nem pensar nos próximos dois
desenhos da série Taumaturgo. Sem pensar nos outros projetos, nos salões de
humor, no calendário gigante do Paulo Caruso na parece, na outra prancheta
menor no corredor de entrada.O computador
dessa casa tem depressão. É máquina sedentária, mora na Liberdade e nunca sai,
está longe da janela e das cores da cidade e convive com Ricardo Soares - um
artista que desenha e pinta à mão - e sempre fala:-
Odeeeeeeeio computador!
São Paulo, 26 de maio de 2005
A ENTREVISTA
Ricardo Soares tem trinta e sete anos.
Desenha e pinta desde os doze.
Seu site é o
www.caricaturaaovivo.com.br.
Nasceu em 14 de novembro de 1967,
em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, Brasil.
Faz caricaturas em aquarela e é uma
das promessas da arte da ilustração no País.
Filho de João Ribeiro Soares e
Carmelita da Silva Ribeiro.
Tem presença em vários salões de
humor.
É colega e amigo dos ídolos de
antes.
Irmão de João Luiz, Rodrigo,
Tânia e Raquel.
Quer voltar a pintar telas a óleo
e diz que o mercado da ilustração no Brasil é muito difícil.
Mudou-se para o Piauí, estado de
seu pai, quando adolescente. Lá, encontrou o professor Ruiz, de geometria e
pintura.
Seu sotaque ainda lembra aquela
temporada.
Foi ao primeiro salão internacional
do humor, na capital piauiense, Teresina, onde conheceu Chico e Paulo Caruso e
outros nomes ilustres do desenho de humor, da caricatura tupiniquim.
Já trabalhava em agência de
publicidade, quando voltou para São Paulo.
Desta vez, suas malas carregaram
a paixão pela caricatura.
Desenha até no meio do pub,
rabisca guardanapo, esboça a caricatura de um, guarda foto de outro para
depois.
Vive no meio das cores, dos
desenhos, dos livros de arte, dos artistas do traço.
É um deles.
Seu apartamento-estúdio tem uma
grande janela, por onde entram luzes, cores e inspirações.
Gosta de sapatos, mas odeia
computador.
Desenha com as mãos. Resiste ao
mercado informatizado.
É filho das cores, herdeiro da
paleta infinita do universo.
Mas tem cabelo preto-e-branco. Ou
branco-e-preto?
Cris Campos - Como é participar da
Quarta Cultural, da Casa do Artista, quando você produz caricaturas em
aquarela ao vivo, com o material da Caran d'Ache?
Ricardo Soares - "Eu acho legal, é uma boa iniciativa da Casa
do Artista. É diferente. E acho que tem tudo a ver com a casa, que pode deixar
a casa muito mais animada. Como é uma das poucas casas da cidade, e talvez do
Brasil, que realmente vende os melhores materiais.
Tem tudo a ver esse tipo de ação
com artistas, de experimentar material, demonstrar material, fazer com que o
artista tenha o contato com o público. É importante.
Isso pode ter um lado comercial,
mas tem um lado social muito interessante, que é o contato do artista com o
público. Acho que a gente está numa época em que o artista não pode mais ser
enclausurado."
Cris Campos - Quando você começou a desenhar?
Ricardo Soares - "Na escola, como todo mundo. No primário.
Fazia cenas, desenhava hasteamento da bandeira, animais. Gostava muito de
desenho animado - Speedy Racer, Homem Aranha. Vários desenhos da época,
do "Globo Cor Especial" (programa da TV Globo)".
Cris Campos - Quando deu o insight para ser desenhista?
Ricardo Soares - "Na verdade, eu comecei a desenhar mais
intensamente quando eu entrei no ginásio.
Tive um professor espanhol que,
além de dar aulas de matemática, física, ele desenhava e pintava muito bem.
Professor Ruiz. Manoel Mariano Ruiz Vasquez.
Eu estudava num colégio de padre
e ele era professor lá. Não era padre. Um colégio de padres espanhóis, da Ordem
de Nossa Senhora das Mercês, da Espanha. No Piauí, em São Raimundo Nonato. Essa
ordem tem algumas sedes no Brasil, no Rio de Janeiro, no Piauí e na Bahia.
Colégio da ordem mercedária da Espanha."
Cris Campos - Porque isso te marcou?
Ricardo Soares - "Porque eu sempre fui muito apaixonado por
desenho e esse contato com o professor Ruiz foi muito importante, porque ele
foi o meu professor dentro da escola e eu tinha aulas particulares também com
ele. Ele dava aulas de geometria. A gente fazia figuras geométricas sólidas.
Ele dava como exercício essas coisas e pintura também.
E através dele, eu conheci a
pintura mais a fundo. E a partir desse colégio, eu comecei a pintar em tela, a
fazer pintura a óleo. Entrei nesse colégio com 15 anos."
Cris Campos - Como veio a profissionalização?
Ricardo Soares - "Eu nasci em São Paulo, em São Caetano do
Sul, em 14 de novembro de 1967. Com 13 anos, fui para o Piauí e fiquei lá 12
anos.
Eu morava no interior do Piauí,
nessa cidade (São Raimundo Nonato). O meu pai foi para lá porque lá ele tinha
condições de pagar um bom colégio; e esse era um bom colégio.
Depois, quando eu terminei o
ginásio e fiz o primeiro ano do segundo grau lá, fui para a capital, Teresina.
Eu fui para o Colégio Agrícola,
de Técnicas Agropecuárias, através da Universidade Federal do Piauí. Eu fiz o
primeiro ano e saí. Acabei abandonando o curso, que não tinha nada a ver
comigo. Aos dezenove anos.
Mas aí eu comecei a conhecer
pessoas que trabalhavam na área, e aí eu fui trabalhar numa agência (de
publicidade). Fui indicado para uma agência, fui lá e mostrei o trabalho.
Eu fazia logotipo, fazia
arte-final. Fazia um trabalho que ninguém mais faz hoje, com o advento da
informática, que é pastup - colava letra por letra, montava texto. Ninguém hoje
precisa fazer mais isso. E ilustrava também, fazia ilustração dentro das
agências. Tive contato com artistas muito bons."
Cris Campos - Mas quando você descobriu a caricatura?
Ricardo Soares - "Ali em Teresina, eu conheci o Salão do
Humor, que é o Salão Internacinal do Piauí, um dos melhores salões do mundo. Eu
comecei a ter contato com os trabalhos de caricatura, desenho de humor. Eu me
apaixonei.
O primeiro salão que eu vi foi em
1987. Eu nem imaginava que existisse um salão daquele no Piauí. Não
discriminando o Piauí, mas eu fiquei surpreso porque o nível do salão e os
convidados de renome que iam lá. Era Luís Fernando Veríssimo, Paulo Caruso, Chico
Caruso, Angeli, Laerte. Eu cheguei a ver tudo isso de uma vez só."
Cris Campos - Foi uma amostra daquilo que seria o seu futuro? Naquela
época, você pensava que se tornaria amigo e colega, por exemplo, do Paulo
Caruso?
Ricardo Soares - "Pois é. Nem imaginava. E quando eu conheci o
salão do Piauí, não conhecia nenhum artista da cidade. Eu ainda estava no
Colégio Agrícola."
Cris Campos - E quando você veio para São Paulo?
Ricardo Soares - "Depois de trabalhar algum tempo lá em
agência. Vim com a cara e a coragem. Sozinho. Quando o trabalho começou a ficar
muito escasso em Teresina, eu vi que era a hora de ir embora e buscar novos
horizontes. Eu sabia que as maiores editoras estavam aqui, os jornais, as
revista, as agências. O mercado de São Paulo é muito melhor.
Tinha que ter vindo mesmo. Não
tinha outra saída.
Foi difícil. O começo foi muito
difícil. Morando em pensão, passando necessidade. Eu fui trabalhar num estúdio
e com o advento da computação, levei um pé-na-bunda do estúdio e não fui
aproveitado."
Cris Campos - Hoje, em quê fase da carreira você está?
Ricardo Soares - "Eu acho que estou numa fase boa. O meu
desenho evoluiu, apesar da estagnação do mercado. Eu acho que o mercado de
ilustrações está um pouco ruim. As editoras pagam cada vez menos.
Com o computador, todo mundo se
tornou ilustrador. Qualquer pessoa pode ser ilustrador hoje em dia, tendo um
Macintosch e as editoras aceitam isso.
Mas eu me sinto bem com o meu
desenho, acho que ele evoluiu apesar de tudo, apesar de todas as dificuldades.
Tenho atuado muito em eventos.
Tem sido uma saída para manter a casa, para manter o ganho, pagar as despesas.
Essa tem sido a luta. Mas eu acho que o artista tem que deixar um registro,
fazer quadrinhos, fazer ilustração. E o mercado não está apreciando muito
isso."
Cris Campos - O que falta?
Ricardo Soares - "Eu acho que tem um certo mercado sim. Mas
para quem não está trabalhando com computador, está se tornando um pouco mais
restrito. O que é uma pena, porque nos Estados Unidos e Europa, isso não é uma
regra. No Brasil, se tornou uma regra: ou você abraça a informática para
trabalhar com ilustração, ou você está fora do mercado. E é uma pena, porque a
mentalidade na Europa e nos Estados Unidos é outra.
Eu acho que se você é um bom
desenhistas, é um bom ilustrador, não importa a técnica com a qual você
trabalha.
No Brasil, se tornou uma
imposição. Porque a maioria os editores de arte acham que você tem que
trabalhar com o computador. São eles que acham; não o ilustrador. Eles têm
pressa em ganhar dinheiro e, quanto mais ilustrador usando computador, menos
eles pagam, porque eles acham que é tudo mais rápido e mais fácil. Quem dita as
regras do mercado da ilustração não é o ilustrador, são os editores de
arte."
Cris Campos - E o que você quer fazer? Qual o teu sonho?
Ricardo Soares - "Eu quero continuar desenhando, melhorando
cada vez mais o meu desenho, quero fazer caricaturas pra salão e gostaria muito
de fazer quadrinho. Mas eu não gostaria de fazer quadrinhos no Brasil, porque
eu não acredito no artista que vive de brisa, no artista que vive de idealismo.
Não que eu seja alguém que só
pensa em dinheiro. Eu acho que o desenho, a arte tem que ser encarado como uma
profissão qualquer. Você depende dessa profissão. Você precisa viver bem
através da profissão, você precisa comer bem, se vestir, comprar material de
qualidade e adquirir cultura através de livros, assistir peças de teatro, ver
cinema de qualidade. O artista precisa disso. E o artista que não ganha bem,
ele não pode fazer nada disso, nem ter paz de espírito pra criar."
Cris Campos - E o que os especialistas que hoje te conhecem, como o
Paulo Caruso, falam do seu trabalho?
Ricardo Soares - "O Paulo gosta do meu trabalho. O Paulo acha
que eu evoluí muito. Eu acho que tem o seu lado bom, mas não me acho também um
fã babaca que vê o ídolo como o extremo. Eu acho que ele passou por fazes e
adquiriu esse renome porque trabalhou muito. Eu estou traçando o meu caminho
também, trabalhando muito e evoluindo no meu desenho. O Paulo é uma referência,
assim como outros artistas foram referência para ele."
Cris Campos - Quem mais é referência para você?
Ricardo Soares - "Eu acho que alguns desenhistas europeus são
referências. Eu gosto muito do caricaturista Sebastian Krüger, que é alemão e
está fazendo um trabalho fantástico pintando as caricaturas dele em acrílico.
Gosto muito do All Hirschfeld,
que morreu já e era americano, como o Will Eisner. Gosto muito do Milo Manara,
que é italiano, o Eleuteri Serpieri. E outros que fazem trabalho já numa outra
linha, como o Dave Mckean, que é inglês, fez muitas capas do Sand Man.
Meu gosto é variado, porque se
você comparar o trabalho do Hirschfeld com o Dave Mckean, são diametralmente
opostos. O Hirschfeld era o mestre da caricatura, o mestre do traço preto, da
caricatura - tanto que ele ficou
conhecido como o King of line, o Rei
do traço. E o Dave Mckean fazia um trabalho totalmente existencialista,
totalmente diferente, pintado, não é traço.
No Brasil, acho que temos grandes
mestres da caricatura: o Paulo, o Chico (Caruso), o Cárcamo, Baptistão do
Estado de S. Paulo, Pavaneli, Dino Alves. E na ilustração, eu tive o prazer de
conhecer o Jayme Leão, que fez as melhores capas de livros didáticos que eu já
vi, as melhores ilustrações para paradidáticos. O Benício também."
Cris Campos, Bons Ventos - E você pretende dar aula?
Ricardo Soares - "Acho que é um objetivo futuro sim, acho que
é legal. Pode ser interessante passar a experiência para outras pessoas, no
futuro."
Cris Campos - É possível ensinar qualquer criança a desenhar?
Ricardo Soares - "Eu acho que é possível, mas a nossa
sociedade educa as pessoas a ganhar dinheiro apenas. E a gente ainda vive muito
influenciado pela idéia de que você tem que ser um doutor para adquirir
respeito na sociedade. Existe essa idéia muito forte ainda.
E parece uma coisa colonial, do
filho do senhor que vai para a Europa e volta com um diploma e, quando volta, é
respeitado por todo mundo. E ele é respeitado por causa daquele diploma, por
causa daquela posição social que ele adquire.
E o Brasil tem essa coisa que eu
acho absurda: se você é artista, você não é respeitado como deveria. Na Europa,
se você é um artista, você é respeitado.
Um professor meu, que era padre,
me falou uma coisa muito interessante uma vez - padre Cassimiro, professor de
filosofia na universidade católica, na PUC (Pontifícia Universidade Católica)
de Salvador -: 'no Brasil, você adquire respeito quando adquire um diploma de
médico, por exemplo, ou quando se torna padre; enquando na Europa, você adquire
respeito quando se torna artista'. É totalmente diferente, é outra
mentalidade."
Cris Campos - Por isso que você fala em
ir para a Europa?
Ricardo Soares - "Eu gostaria de ter essa experiência sim. Sei
que não é fácil. Acho que o artista na Europa ainda é mais bem remunerado que
no Brasil."
Cris Campos - E o que falta?
Ricardo Soares - "Acho que o ponta-pé inicial seria ter
dinheiro para chegar lá. Apesar do meu objetivo ser ganhar dinheiro com o meu
trabalho, seria chegar lá também um pouco amparado financeiramente. Aqui está
difícil."
* * *
Nota: Entrevista concedida em 19 de maio de 2005, no Café Creme, da Avenida
Paulista, em São Paulo. Logo depois de visita à Casa do Artista. Noite bonita,
um pouco fria, regada a cerveja, porção de frango grelhado com torradas e
catupiri e um simpático vendedor de pequenos bonecos de pano.